Entramos em 2021 como se 2020 continuasse aqui. A pandemia-sem-fim nos relembra diariamente que precisamos repensar uma série de dilemas da nossa sociedade. Neste dia das mães, falar do projeto Mães em Quarentena é reforçar a importância de dar luz a projetos como esse. Seguimos tentando mexer nas estruturas.
O projeto
Uma empreendedora, uma migrante autônoma e uma mãe do meio corporativo, todas com filhos entre 1 e 5 anos de idade. A partir do início da pandemia, em 2020, tomamos nossa experiência pessoal como ponto de partida e somamos inquietudes, desafios pessoais e profissionais para gestarmos juntas o projeto Mães em Quarentena.
Ao longo de sete meses, escutamos quase 200 mães, no Brasil e na Espanha, que passaram a trabalhar de casa a partir do início da pandemia. Nos debruçamos sobre as pesquisas que foram saindo sobre os impactos da pandemia na vida das mulheres, em especial das mães. Depois de um tempo, passamos a abrir diálogo com diferentes interlocutores sobre os principais desafios que encontramos.
Os desafios identificados
Dividimos a pesquisa em três eixos: a saúde e o equilíbrio emocional, a conciliação da maternidade e o trabalho e os cuidados com a casa e com as crianças. Percebemos que as semelhanças de contexto têm origem em problemas estruturais da sociedade em que vivemos.
Entre os principais desafios estão o desaparecimento da rede de apoio (escolas, creches, parentes e vizinhos) e a distribuição desigual de tarefas de cuidado entre homens e mulheres. Além disso, apareceram a falta de estrutura para trabalhar, desempenho de novas funções, ampliação do horário do trabalho e o impacto emocional a partir de todo o contexto.
Mesmo vivendo com companheiros/as, as mães são a principal responsável por cerca de 70% das atividades de cuidado com a casa e crianças. No caso das mães solo, que correspondem a 26% das mães participantes, 97% tiveram que continuar trabalhando e não tiveram nenhum apoio para cuidados com casa e filhos, gerando uma sobrecarga inimaginável.
Em relação ao ambiente de trabalho, metade das mães não teve nenhum suporte na adaptação do contexto de home office e apenas 20% foi verbalmente reconhecida por seu desempenho em um contexto tão adverso.
“É como viver no trabalho ou levar as crianças para o escritório todos os dias”, diz uma das mães entrevistadas.
A partir dos relatos, notamos um esforço das mães para “caberem” dentro do mercado de trabalho: os ajustes normalmente são delas.
Propostas e perspectivas
As participantes da pesquisa também falaram sobre o mundo que desejam ver. Como resultado, a pesquisa aponta para mudanças coletivas para um mundo pós-pandemia. As propostas vão desde as esferas individuais e relacionais como a sororidade, empatia e reconhecimento, como provocações para ampliar políticas públicas.
São desejos de mudanças que permitam que as mulheres exerçam a maternidade de uma forma presente, sem ter que abandonar todos os outros aspectos da vida.
Embora tanto para as participantes do Brasil quanto da Espanha haja um aumento no sentimento de solidariedade, reconhecimento de privilégios e interesse em conhecer mais sobre padrões de gênero, há algumas diferenças. Percebemos uma maior preocupação das mulheres espanholas com o consumo consciente e questões ambientais para o cenário futuro. No caso das brasileiras, percebemos uma maior aproximação com as perspectivas feministas do ponto de vista da urgência de lidar com a cadeia de desigualdades que unem as mulheres profissionais às trabalhadoras domésticas, muitas também mães e em situação de vulnerabilidade ainda maior.
O que se tornou evidente é a necessidade de mudanças. Nisso, as mulheres brasileiras e espanholas concordam plenamente.
Sobre as autoras
- Carolina Alves de Jongh, mãe do Lucas e do João, é administradora de empresas e mestre em psicologia social. Fundadora da Janela 8, atua para a ampliação dos direitos e do protagonismo das mulheres.
- Márcia Alexandre, é mãe do Pedro de 5 anos e cuidadora de 2 gatos. No início da Pandemia era sócia da Tistu e desde julho de 2020 é funcionária de um instituto empresarial
- Sheila Saraiva é comunicadora, mãe do Milo, é imigrante na Espanha, onde vem estudando questões de gênero, migração e direitos humanos desde 2013. Empreende com o projeto @Eco.Laborativa
O Sumário Executivo do projeto está disponível no link abaixo: